Pequenas bobagens que traçam nosso destino
Enviado: Ter Mai 06, 2008 4:19 pm
Opa ^^ bom li isso no jornal hoje aqui no trabalho, e nossa Arnaldo Jabor é uma das poucas pessoas que hoje em dia no Brasil tem coragem de dizer o que realmente pensa, esta matéria é muito boa, espero que gostem também.
Pequenas bobagens que traçam nosso destino
Há muitos anos, percebi que haviam modificado a caixa grande dos Chicletes Adams. Essas caixinhas tinham uma janela de celofane, através da qual se viam os chicletinhos. Um dia, notei que a janela tinha sido trocada por falsa abertura: desenho na caixa com os chicletinhos. Algum executivo zeloso tinha cortado despesas, eliminando a doce escotilha por onde se viam as balinhas frescas como a brisa. Bobagem, não? Mas, senti que a “pos-modernidade” estava começando. É isso: nas irrelevâncias do cotidiano se escondem indícios de nosso destino.
O Brasil vive uma ridícula revolução de costumes, sarapatel de velhas idéias e novas anomalias que mataram os velhos conceitos que nos explicavam. Há um pós-poder, uma pós-corrupção, uma pós-direita, um pós-crime, uma pós-miséria, uma pós-língua se cristalizando. Sou colunista de jornal há 17 anos. Falo na TV há 13. No rádio, há mais de cinco. E vejo que as palavras que sempre usei já não bastam. As idéias não correspondem mais aos fatos. Só nos restam os indícios.
Querem entender o ódio que os jovens dedicam ao país? Vejam as paredes do Rio e São Paulo. Não existe nesga de muro que não exiba pichação. Vingam-se das cidades que os excluem. Não há slogans, ou protestos. Apenas hieróglifos para sujar a melhor pedra, o mármore; qualquer beleza tem de ser destruída. As pichações são o manifesto do não-sentido. Que nome daremos a este imenso bucho informe que a miséria cria nas periferias? A razão da barbárie cria uma língua feita de grunhidos, em torno da morte e da droga. As palavras, a pronúncia, a gíria letal dos bandidos acena com um futuro de guerras sem trégua.
Outra pergunta: que estará anunciando para nosso futuro esta repetição de escândalos políticos jamais resolvidos?
O Lula, eufórico com seu Ibope, estimula esta impunidade, pela perversão esperta que agora pratica de apoiar indiciados, de se abraçar com os mais tenebrosos corruptos. Isto também é uma linguagem no ar. A negativa de crimes mais evidentes, o “não sei”, o “não fui eu” vai criando uma espécie de “jurisprudência da impunidade”.
Mesmo nas micro-bobagens, como no chiclete sem janela, vejo dicas de mutação. Fico alucinado com a febre de uma pseudo-linguagem executiva, algaravia técnica e informática que enche nossos ouvidos: celulares em voz alta na rua, aeroportos, cinemas. Outro dia, no avião, vi um sujeito demitir no celular um empregado aos berros: “Rua! Vou te cozinhar com a maça na boca!”
E as campainhas? De repente, um funk, um “Pour Elise”, uma cornetinha trauteando. Por que não fazem celular que aperte o saco do usuário? Ele daria um grito e gemeria baixinho: “Alô”! Odeio “gadgets” como black berries que nos acorrentam nas informações, que nos faz viver em alerta, espantalhos elétricos conectados a tudo: rádio, videogame, previsão do tempo, torpedinhos, um suspense de que algo vai chegar e nos salvará, ou matará.
Que recado nos traz a evidente hiper-sexualização das moças no Brasil. Todas se vestem de “cachorras”, barriguinha de fora, ingênuas com rebolados intensos. Riam de mim, mas não agüento mais bundas.
Fico doido quando uma telefonista me pergunta: “Quem deseja?” Tenho ganas de gritar: “O ser humano deseja!” Mas, ela continua: “Senhooorrr, o Dr. Fulano não se encontra...”.
Quando peço um guaraná, lembrando das belas frutinhas amazônicas, ouço: “Com gêlo e laranja?” Por quê? O meu guaraná indígena não basta mais? Quem inventou essa besteira? Tenho ainda a esperança de encontrar um velho garçom que me pisque o olho e pergunte” “Da Brahma ou da Antártica”?
Repugnam-me células fotoelétricas em bicas de banheiros chiques. Você mete a mão ensaboada debaixo de bica dourada e a água não sai. Tenta de novo, nada. Até que o faxineiro te ensina a posição certa, esperando a gorjeta. A água jorra e pára, antes de lavar o sabão.
Estamos mudando nesses indícios. Estamos afogados pelo ferro-velho mental do país, pelas oligarquias felizes e impunes, por um Judiciário caquético, pelas caras deformadas de políticos, pelas barrigas, gravatas escrotas, pela gomalina dos cabelos, pelas notas frias, pela boçalidade dos discursos, estamos soterrados de detritos de vergonhas, togas de desembargadores, bicheiros soltos, balas perdidas, crianças assassinadas, celebridades imbecis, depressões burguesas, doenças tropicais, dengue, barriga d’água, barbeiros e chagas, enchente que não drenou, irresponsabilidades fiscais, assassinos protegidos no Congresso, furtos em prefeituras, municípios apodrecidos.
Cientistas políticos não bastam. Precisamos de detetives da mediocridade brasileira.
Arnaldo Jabor
Fonte: http://www.bomdiasorocaba.com.br/index. ... mat=130011
Pequenas bobagens que traçam nosso destino
Há muitos anos, percebi que haviam modificado a caixa grande dos Chicletes Adams. Essas caixinhas tinham uma janela de celofane, através da qual se viam os chicletinhos. Um dia, notei que a janela tinha sido trocada por falsa abertura: desenho na caixa com os chicletinhos. Algum executivo zeloso tinha cortado despesas, eliminando a doce escotilha por onde se viam as balinhas frescas como a brisa. Bobagem, não? Mas, senti que a “pos-modernidade” estava começando. É isso: nas irrelevâncias do cotidiano se escondem indícios de nosso destino.
O Brasil vive uma ridícula revolução de costumes, sarapatel de velhas idéias e novas anomalias que mataram os velhos conceitos que nos explicavam. Há um pós-poder, uma pós-corrupção, uma pós-direita, um pós-crime, uma pós-miséria, uma pós-língua se cristalizando. Sou colunista de jornal há 17 anos. Falo na TV há 13. No rádio, há mais de cinco. E vejo que as palavras que sempre usei já não bastam. As idéias não correspondem mais aos fatos. Só nos restam os indícios.
Querem entender o ódio que os jovens dedicam ao país? Vejam as paredes do Rio e São Paulo. Não existe nesga de muro que não exiba pichação. Vingam-se das cidades que os excluem. Não há slogans, ou protestos. Apenas hieróglifos para sujar a melhor pedra, o mármore; qualquer beleza tem de ser destruída. As pichações são o manifesto do não-sentido. Que nome daremos a este imenso bucho informe que a miséria cria nas periferias? A razão da barbárie cria uma língua feita de grunhidos, em torno da morte e da droga. As palavras, a pronúncia, a gíria letal dos bandidos acena com um futuro de guerras sem trégua.
Outra pergunta: que estará anunciando para nosso futuro esta repetição de escândalos políticos jamais resolvidos?
O Lula, eufórico com seu Ibope, estimula esta impunidade, pela perversão esperta que agora pratica de apoiar indiciados, de se abraçar com os mais tenebrosos corruptos. Isto também é uma linguagem no ar. A negativa de crimes mais evidentes, o “não sei”, o “não fui eu” vai criando uma espécie de “jurisprudência da impunidade”.
Mesmo nas micro-bobagens, como no chiclete sem janela, vejo dicas de mutação. Fico alucinado com a febre de uma pseudo-linguagem executiva, algaravia técnica e informática que enche nossos ouvidos: celulares em voz alta na rua, aeroportos, cinemas. Outro dia, no avião, vi um sujeito demitir no celular um empregado aos berros: “Rua! Vou te cozinhar com a maça na boca!”
E as campainhas? De repente, um funk, um “Pour Elise”, uma cornetinha trauteando. Por que não fazem celular que aperte o saco do usuário? Ele daria um grito e gemeria baixinho: “Alô”! Odeio “gadgets” como black berries que nos acorrentam nas informações, que nos faz viver em alerta, espantalhos elétricos conectados a tudo: rádio, videogame, previsão do tempo, torpedinhos, um suspense de que algo vai chegar e nos salvará, ou matará.
Que recado nos traz a evidente hiper-sexualização das moças no Brasil. Todas se vestem de “cachorras”, barriguinha de fora, ingênuas com rebolados intensos. Riam de mim, mas não agüento mais bundas.
Fico doido quando uma telefonista me pergunta: “Quem deseja?” Tenho ganas de gritar: “O ser humano deseja!” Mas, ela continua: “Senhooorrr, o Dr. Fulano não se encontra...”.
Quando peço um guaraná, lembrando das belas frutinhas amazônicas, ouço: “Com gêlo e laranja?” Por quê? O meu guaraná indígena não basta mais? Quem inventou essa besteira? Tenho ainda a esperança de encontrar um velho garçom que me pisque o olho e pergunte” “Da Brahma ou da Antártica”?
Repugnam-me células fotoelétricas em bicas de banheiros chiques. Você mete a mão ensaboada debaixo de bica dourada e a água não sai. Tenta de novo, nada. Até que o faxineiro te ensina a posição certa, esperando a gorjeta. A água jorra e pára, antes de lavar o sabão.
Estamos mudando nesses indícios. Estamos afogados pelo ferro-velho mental do país, pelas oligarquias felizes e impunes, por um Judiciário caquético, pelas caras deformadas de políticos, pelas barrigas, gravatas escrotas, pela gomalina dos cabelos, pelas notas frias, pela boçalidade dos discursos, estamos soterrados de detritos de vergonhas, togas de desembargadores, bicheiros soltos, balas perdidas, crianças assassinadas, celebridades imbecis, depressões burguesas, doenças tropicais, dengue, barriga d’água, barbeiros e chagas, enchente que não drenou, irresponsabilidades fiscais, assassinos protegidos no Congresso, furtos em prefeituras, municípios apodrecidos.
Cientistas políticos não bastam. Precisamos de detetives da mediocridade brasileira.
Arnaldo Jabor
Fonte: http://www.bomdiasorocaba.com.br/index. ... mat=130011